Dizem que os olhos são a janela da alma.
Não sei se serão, provavelmente por descuido e impossibilidade de analisar as almas.
Mas há olhos que nos prendem. Pela forma como enquadram um rosto, pela tristeza ou felicidade que deles emana, pela timidez ou coragem, porque sem olhos seríamos bem menos expressivos.
E lembro-me dela, a entrar na sala, num passo tímido, com os olhos em baixo.
Dela à procura de uma cara conhecida, em vão.
E enquanto ela percorria a sala, os meus olhos tentavam percorrer os seus, ciente de que não me via.
Via o nariz pequeno, bem desenhado, o cabelo castanho, pelo ombro, o vestido justo ao corpo, mas não demasiado justo, e a timidez, que de tão grande a vestia segunda vez.
Ela olhou-me, nos olhos, um segundo, menos que isso. Sentou-se numa das cadeiras, e ali ficou.
Numa folha de papel somos que quisermos, como quisermos. Num conto somos valentes e corajosos. Na vida real, na vida real temos medo do outro.
Fiquei mais algum tempo ali. Olhando para ela, de costas para mim. Imaginando aquilo que poderia ver, se quisesse. Os olhos dela.
Saí, e voltei a casa.
Num conto podemos inventar futuros, realidades, possibilidades. Na vida real amaldiçoamos a cobardia, e os momentos que deixamos passar.